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1901—1996

Mensagem aos Sambistas de Santos

Antes de aflorar minha MENSAGEM AOS SAMBISTAS DE SANTOS, permito-me acentuar o valor dessa cidade histórica, politizada, laboriosa, cultural e cívica, à qual me ligam laços sentimentais.

 

Em Santos, nesta gleba hospitaleira, passei parte de minha juventude como funcionário da Empresa Loyde Brasileiro, exercendo atividades no movimentado Cais do Porto de Santos, onde assistia, diariamente, sem cessar, entrada e saída de navios. Os guindastes, num vai e vem constante, não paravam, carregando e descarregando mercadorias variadas, atendendo assim a operosidade rápida dos trabalhadores da estiva, que, em fila indiana, transportavam volume do pátio externo ao interno, e vice-versa. Era empolgante vê-los expressivo formigueiro humano.

 

A epidemia espanhola, que ceifou tantas vidas nessa cidade, quiçá do Brasil foi um episódio melancólico que ainda não se apagou de minha memória.

 

Para socorrer as vítimas da calamidade, o operoso Tiro XI de Guerra, foi convocado, prestando, com a dedicação exemplar de seus filiados, serviços humanitários em vários locais da cidade. O nosso Posto de Assistência era no Bairro do Campo Grande, ao lado de toda a Avenida Ana Costa, onde aviam muitas chácaras de japoneses.

 

O Sargento Laranja, pertencente à tradicional família santista, era o nosso chefe, que pouco permaneceu no comando: foi logo uma das vítimas da peste!

 

Por ocasião de seu sepultamento, na acrópole de Paquetá, recebeu a gratidão da população comovida.

 

Os personagens inseparáveis da existência de Santos, cada qual em sua missão, desde seus fundadores, salientando Braz Cubas, a figura inconfundível da história pátria - José Bonifácio de Andradas e Silva, o Patriarca, a acuidade política de seus homens públicos, entre os quais os Andradas, no passado, e os irmãos Feliciano, mais recentes, o prestígio da imprensa, pontificado no tradicional órgão A TRIBUNA, fundado pelo saudoso jornalista M. Nascimento Junior, e a sensibilidade de seus poetas, palpitante em Xavier da Silveira, o "caráter adamantino", em Vicente de Carvalho, o parnasiano, o magistrado, o apaixonado do mar, e, afinal, em Martins Fontes, o "poderoso artista", fascinaram-me o espírito.

 

Martins Fontes, de uma emotividade contagiante, cheguei a conhecê-lo numa feliz tarde de autógrafo, realizada no cinema Politeama, situado, na época, no antigo Largo do Rosário, quando o vate santista presenteou a sociedade de sua terra o livro - O VERÃO. Ele mesmo declamava com muita arte, seus versos, sob os aplausos de uma platéia deslumbrada.

 

Como disse Alcântara Worms, em sua obra - Poemas Paulista, que o poeta "José Martins Fontes, o inolvidável Zezinho Fontes, era lírico, panteísta, épico, e até quando necessário, satírico".

 

Essas singelas reminiscências, e outras que ainda guardo em meu ser, autorizam-me a tornar bastante intimo entre os meus amigos dessa comunidade que tanto valoriza a inteligência, a cultura e o trabalho.

 

Falar de Samba, olvidando o nome do jornalista J. Muniz, incontestável apaixonado pesquisador da cultura popular brasileira, e sem avaliar o já consagrado esforço da Escola de Samba X-9, a pioneira em reconhecer a lei estadual sobre o Dia do Samba - 2 de dezembro, agora de repercussão nacional, desde 1963, e seguida de tantas outras congêneres, tais como a Escola Brasil e União Imperial, é desmerecer a verdade histórica.

 

A música, dentre a manifestação desta cultura, sem dúvida alguma, tem especial destaque, e ela se corporifica num conjunto de ritmos e melodias em que notam claramente todas as influências que contribuíram para a formação de diferentes estilos de música popular brasileira, as da raça negra registram particular preponderância, tendo dado origem aos ritmos, aos cânticos populares que, partindo da Bahia, se difundiram pelos país e ancoraram no Rio de Janeiro.

 

Dos muitos ritmos, cujas origem vamos encontrar nos negros, e cujo trabalho a nacionalidade deve tanto de sua formação, os do samba têm significado todo peculiar e representam na sua infinita gama de acordes e variações melódicas, uma grandeza musical que de modo algum pode ser ignorada. Assim pensando e desejando homenagear no samba toda a cultura musical do povo, apresentei, quando Deputado na década de 60, o Projeto de Lei nº 681 que, transformado na Lei nº 554, de 27/7/1964, instituiu como DIA DO SAMBA a data de 2 de dezembro de cada ano. Assim tentamos, anualmente, um dia para homenagear o SAMBA, recordando suas origens e evolução, bem como preservando suas gloriosas tradições na memória nacional.

 

Grande divulgador da música popular brasileira e homem devotado do SAMBA, o jornalista J. Muniz Júnior introduziu o DIA DO SAMBA na cidade de Santos e, todos os anos, ele vem se esforçando para dar cada vez maior realce à data, congregando em brilhantes eventos as Escolas de Samba e todos aqueles que amam a cultura musical popular e se obstinam em resguardá-la das múltiplas influências alienígenas que tentam descaracterizá-la.

 

Em 1981, através de J. Muniz Júnior, no dia 2 de dezembro, estive em Santos, convidado pela Escola de Samba X-9, e tive a imensa satisfação de ver o modo sério e de absoluta disciplina com que estava sendo comemorado o DIA DO SAMBA, num ritual na verdade imponente e tendo a participação das agremiações mais representativas do Município.

 

Ao finalizar essa singela MENSAGEM, diretamente dirigida ao Mundo do Sambista, impõe-me a civilidade, como homem público de realçar a principal figura da Comunidade Santista, a Professora Telma de Souza, na certeza de sua sensibilidade pelas causas populares, numa simbiose de sentimentos elevados.

 

 Rio de Janeiro, 19 de outubro de 1990

Anésio Frota Aguiar

 

Fonte: O Dia do Samba em Santos (1963 - 1990

 Publicação: Prefeitura Municipal de Santos.

 

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